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Aldeia Multiétnica Filhos Desta Terra celebra sete anos de retomada do território

Aldeia Multiétnica Filhos Desta Terra celebra sete anos de retomada do território

Cimi Sul
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Aldeia Multiétnica Filhos Desta Terra celebra sete anos de retomada do território, denunciando a morosidade do processo de reconhecimento do território e na efetivação de políticas públicas básicas e específicas

Guarulhos, SP No último dia 27 de outubro a Aldeia Multiétnica Filhos Desta Terra, localizada no município de Guarulhos/SP, comemorou seu sétimo aniversário de retomada com um evento cultural que reuniu várias etnias indígenas da região metropolitana de São Paulo. Atualmente a Aldeia conta com a presença de aproximadamente 40 famílias indígenas, das etnias Tupi Guarani, Kaimbé, Timbira, Guajajara, Pankararé e Pankararu, que lutam diariamente pela garantia do direito ao território como também da efetivação de garantia de educação e saúde diferenciada, como também acesso ao saneamento básico.

Breve histórico

Entre as pautas de reivindicação, ganha força o pedido em ter um espaço onde algumas famílias possam morar e viver da forma como viviam em suas aldeias de origem. Foto: Cimi Sul/Equipe São Paulo.

Em meados de 2008 inicia-se um processo de articulação e organização dos indígenas presentes no contexto urbano do município de Guarulhos, que passam a reivindicar do Poder Público o reconhecimento indígena, como também a garantia de direitos específicos, principalmente no que se refere ao atendimento diferenciado de saúde.

Entre as pautas de reivindicação, ganha força o pedido em ter um espaço onde algumas famílias possam morar e viver da forma como viviam em suas aldeias de origem (aldeia – mãe), realizando práticas culturais e espirituais. Em janeiro de 2017 a Prefeitura de Guarulhos cria um Grupo de Trabalho para responder a essa reivindicação, que apresenta para as lideranças duas áreas, sendo escolhida pelos indígenas a área localizada no bairro do Cabuçu, dentro da APA Tanque Grande – Área de Proteção Ambiental.

Durante o processo dos trâmites legais para que os indígenas possam ter usufruto deste espaço, após realizarem visitas na área, a Prefeitura suspende as negociações com as lideranças indígenas, não realizando os encaminhamentos acordados e rompendo o diálogo. No dia 27 de outubro os indígenas retomam a área prometida, fundando a Aldeia Multiétnica Filhos Desta Terra.

Foto: Cimi Sul/Equipe São Paulo.

Luta, resistência e conquistas

No encontro de celebração dos sete anos de retomada do território, as lideranças realizam um balanço das conquistas já alcançadas e das lutas que estão sendo travadas para garantir a presença da comunidade indígenas e a garantia dos direitos indígenas nesse território.

Nesses sete anos as lideranças da Aldeia, através de mobilizações, garantiram a presença de uma médica especialista em saúde da família e na saúde indígena, que atende as famílias dentro do território, porém ainda não é uma política pública efetivada. A Aldeia não conta com um posto de saúde onde poderiam ser realizadas as consultas que exigem privacidade e ser armazenado medicamentos, prontuários e demais materiais necessários. Há uma Ação Civil Pública do MPF de Guarulhos contra a SESAI, que nega o atendimento a Aldeia Multiétnica, dizendo ser uma realidade de contexto urbano, que ficaria à cargo do município

A necessidade de uma escola indígena é uma demanda já apresentada para a FUNAI, Secretaria Estadual de Educação e Coordenadoria de Políticas para os Povos Indígenas, mas que até o presente momento a Aldeia está sem respostas. Além das crianças e adolescentes que não conseguem sair da Aldeia para estudar nas escolas da cidade, por conta da dificuldade do acesso e mobilidade, há uma população de pessoas adultas e idosas com desejo de serem alfabetizadas e retomar os estudos.

Por fim, a segurança ao território é a mãe das lutas. Após esses sete anos de Aldeia, a comunidade indígena aguarda para que a FUNAI dê início ao processo administrativo de reconhecimento deste território, como reserva indígena, porém, nenhuma etapa ainda foi iniciada.

Cuidado com a natureza e recuperação do solo e das nascentes

Após a retomadas, os indígenas identificaram que parte da área oferecida pela prefeitura é degradada e contaminada, por se tratar de uma área de antigo aterro sanitário, sendo encontrado todo tipo de material. Ao andar é possível ver, em alguns trechos do território,  pedaços de cerâmicas, pedras, cacos de vidros, ampolas remédios e agulhas, por exemplo.

O cuidado do solo e principalmente a proteção das nascentes se tornou a grande fonte motivadora dos indígenas permanecerem nessa Terra Sagrada, recuperando o que os não-indígenas destruíram. Cabe destacar que os indígenas descobriram nascentes que foram aterradas, pela obra de construção da Rodovia Rodoanel, que sobrepõe, cortando área da Aldeia.

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Por conta da contaminação, os roçados e plantios são realizados em canteiros altos, com terra boa, garantindo assim espaços mínimos para uma alimentação saudável e principalmente de ervas que curam.

Artesanatos como resistência e fortalecimento cultural.

Nesse território, os povos indígenas presentes hoje, vivem transformando essa “área” em um território de uso tradicional. Foto: Cimi Sul/Equipe São Paulo.

A presença de diversos povos garante uma riqueza de artes produzidas da Aldeia Multiétnica, podendo encontrar utensílios de uso doméstico (como cestarias do povo Tupi Guarani e os potes e pratos de barro do povo Pankararu), objetos sagrados de uso em ritos espirituais (como os cachimbos de cada povo: petyngua e o capiô, rapé, fumo temperado e colares de proteção); adereços de decoração, como brincos, tiaras feito de penas e sementes.

A confecção dos artesanatos possibilitou o fortalecimento cultural de cada um dos povos presentes na Aldeia Multiétnica, possibilitando espaço de troca dos saberes e das práticas de cada um dos povos, como também renda, advinda da comercialização das peças em feiras e nas visitas realizadas na Aldeia.

A Aldeia Multiétnica Filhos Desta Terra como fruto de uma mobilização de indígenas que saíram de suas aldeias de origem e viviam em situação de contexto urbano, é um sinal de esperança e “retomada” do sentido do bem viver, que é a essência dos povos originários. Nesse território, os povos indígenas presentes hoje, vivem transformando essa “área” em um território de uso tradicional.