Cercos
Não bastam as cercas, que limitam e dividem, eles – fazendeiros, seus capangas e as forças de segurança – se armam e realizam cercos contra os povos indígenas.
Não bastam a omissão e negligência dos que governam – em relação aos direitos originários – são necessários os cercos.
Não bastam violentarem as famílias – mulheres, crianças, idosos – que apenas desejam respeito e a terra mãe, ainda assim, impõem-se a elas os cercos.
Não bastam as antipolíticas, através das quais nega-se assistência básica, vão bem além, e criam-se os cercos.
Não bastam as ações judiciais e as decisões espúrias contra os povos e suas lutas, precisam também dos cercos.
Não bastam as violências cotidianas, os ataques contra suas comunidades – contra os seus corpos – é necessário mais e promovem-se os cercos.
Não bastam os juízes, desembargadores e ministros decidirem, em geral, contra os povos indígenas, precisam dos cercos.
Não bastam os governantes negarem a demarcação dos territórios originários, os agressores querem sempre – sempre mais – e realizam os cercos.
Não bastam os tiros, os incêndios, as perseguições, o racismo e o preconceito, há ainda os cercos.
Não bastam os latifundiários e seus pistoleiros atormentarem a vida dos povos em suas aldeias, há ainda os cercos.
Não bastam os capitães do mato, que traem os seus irmãos e irmãs nas lutas por direitos e liberdade, os agressores ambicionam bem mais e criam os cercos.
Não bastam os poderes públicos, em conluio, buscarem a desterritorialização dos povos, há de se ter os cercos.
Não bastam os subterfúgios ao negar o direito à terra, mitigando-o por migalhas prometidas da mesa dos ricos, há, ainda assim, de se ter os cercos.
Não bastam as teses ilegais, a lei inconstitucional do marco temporal, eles precisam estabelecer os cercos.
Não bastam a tortura psicológica contumaz e sistemática, eles, os genocidas do agronegócio, fazem cercos.
Não bastam o silêncio, o apagamento, o isolamento e a negação dos direitos fundamentais eles, os de cima da pirâmide, criam os cercos.
Não bastam a satisfação de fazer sofrer, espezinhar, maltratar, agredir, caçar como se bicho fossem, há, somando-se a isso tudo, os cercos.
Até quando?
Porto Alegre (RS), 26 de julho de 2024
Roberto Antônio Liebgott é missionário do CIMI - Conselho Indigenista Missionário, atuando na região Sul do Brasil.