Comunidade Kaingang denuncia poluição do Rio Monte Alegre e atos de racismo contra indígenas em Chapecó (SC)
Por Ivan Cesar Cima e Jacson Santana/Cimi Sul.
Chapecó (SC) – A comunidade Kaingang da Aldeia Kondá encaminhou ao Ministério Público Federal (MPF), no último dia 15 de dezembro, duas denúncias graves envolvendo violações de direitos no município de Chapecó, no Oeste de Santa Catarina. Elas tratam da poluição do Rio Monte Alegre, com registro de mortandade de peixes, e da disseminação de discursos de ódio, preconceito e racismo contra povos indígenas em redes sociais.
O Rio Monte Alegre atravessa o território indígena e é essencial para a vida das famílias da Aldeia Kondá, sendo utilizado diariamente para a pesca, o consumo de água e atividades tradicionais. Junto à denúncia por crime ambiental, a comunidade entregou imagens e vídeos que mostram peixes mortos ao longo do curso do rio, evidenciando a gravidade da contaminação.

Segundo as lideranças Kaingang, o rio sempre foi cuidado e preservado pela comunidade, pois representa não apenas uma fonte de alimento, mas também um elemento central da relação cultural do povo Kaingang com a natureza. De acordo com o cacique Efésio Siqueira, o problema é recorrente.
“Essa poluição não é um fato isolado. Já fizemos outras denúncias e, mesmo assim, o problema continua. Agora, além do cheiro forte e da mudança na água, estamos vendo peixes mortos. Isso mostra claramente que o rio está sendo envenenado”, afirma.
As imagens anexadas à denúncia, reforçam a preocupação da comunidade com os riscos à saúde das famílias, especialmente de crianças e idosos, que mantêm contato direto com o rio.

CRIME DE RACISMO
Além da contaminação ambiental, a comunidade Kaingang também denunciou ao MPF atos de preconceito, discriminação e racismo contra indígenas, ocorridos no mês de novembro e amplamente divulgados por meio de comentários em uma publicação em rede social relacionada à presença indígena em Chapecó.
Segundo a denúncia, diversos usuários utilizaram expressões pejorativas, estereótipos e falas abertamente racistas, estimulando a hostilidade social e criando um ambiente de insegurança e ameaça à integridade física e moral de indígenas que vivem ou circulam pela cidade.
Para a comunidade, esse tipo de manifestação não atinge apenas indivíduos, mas viola direitos coletivos, reforça práticas discriminatórias históricas e contribui para a naturalização do racismo contra os povos originários.
As lideranças destacam que tais condutas configuram, em tese, crime de racismo, conforme a Lei nº 7.716/1989, além de violarem dispositivos da Constituição Federal e tratados internacionais ratificados pelo Brasil, como a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que garante o respeito à identidade social, cultural e coletiva dos povos indígenas.
ENCAMINHAMENTOS

Nas representações protocoladas junto ao Ministério Público Federal, em Chapecó, a comunidade Kaingang da Aldeia Kondá requer a instauração de procedimentos administrativos e investigatórios autônomos para a apuração dos fatos denunciados. No que se refere à contaminação do Lajeado Monte Alegre, solicita a realização de diligências técnicas e perícias ambientais, a identificação dos agentes causadores da poluição, a adoção de medidas cautelares e corretivas imediatas para cessação dos danos, a recuperação ambiental do curso d’água e a consequente responsabilização administrativa, civil e penal dos responsáveis.
Quanto aos atos de preconceito, discriminação e racismo praticados em ambiente virtual, requer a identificação dos autores, a requisição de preservação e fornecimento de dados às plataformas digitais, a adoção das medidas legais cabíveis, inclusive nas esferas criminal e cível, bem como a avaliação da necessidade de medidas protetivas e preventivas, diante do risco de reiteração das condutas. Em ambos os casos, a comunidade solicita o acompanhamento permanente do MPF, com observância aos direitos territoriais, culturais e humanos do povo Kaingang, nos termos da Constituição Federal e da Convenção nº 169 da OIT.
Para a comunidade Kaingang da Aldeia Kondá, tanto a poluição do rio quanto os ataques racistas fazem parte de um mesmo cenário de violação de direitos territoriais, culturais e humanos, que exige resposta firme do Estado.
“Quando o rio adoece, nosso povo também adoece. Quando somos atacados com ódio e racismo, nossa dignidade também é ferida”, afirma o cacique Efésio Siqueira, acrescentando ainda: “O que queremos é justiça, respeito ao nosso território e respeito à nossa existência. ”
A comunidade Kaingang da Aldeia Kondá segue mobilizada e aguarda providências urgentes das autoridades, tanto para a recuperação do Rio Monte Alegre quanto para o enfrentamento ao racismo e à discriminação contra os povos indígenas em Chapecó e região.
Jacson Lopes Santana é membro do Conselho Indigenista Missionário - CIMI Sul.
