Rasgado o verbo em cuia
Servida como farinha-mole
Pimenta e muita pimenta
Cevada com cachaça pura.
Rasgado o corpo a viola
Bem tocada por quem anda
Tocando a vida
Em romaria.
Rasgado o véu da janela
Que não pode mais
Esconder o sol
Obrigando-me
A despojar-me.
Rasgada seja a vida inteira
Em feira
Não permitindo
Deixar de ouvir os gritos
Botando preço em tudo.
Rasgaria o rasgado todo
Todo dia, dia e noite
No açoite da minha cabeça
Rachada a pingos
De água fria.
Ângelo Bueno é poeta ativista, membro do Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Entre os anos de 1982 a 1992 atuou na região Sul com os povos Guarani e Kaingang. De 1992 até hoje atua com os povos indígenas do Nordeste, em Pernambuco e Norte da Bahia. Sempre percebeu a importância da arte para rever paradigmas e favorecer a construção da sociedade democrática, fazendo parte dos poetas marginais, denunciando as violências praticadas pela necropolítica e anunciando o bem-viver em terras de ABYA YALA.