Ser de direita ou ser de esquerda
Ocorre, no ambiente de pós eleições municipais, um debate especulativo sobre as expectativas das pessoas, onde se diz, de um lado, que uma grande parcela delas está ideologicamente politizada à direita, mas, de outro lado, há medo ou receio em declararem-se como sendo de esquerda.
Prospera um discurso, especialmente nos meios de comunicações e redes sociais, de que ser de direita é bacana, enquanto que, afirmar-se de esquerda é ultrapassado, autoritário, típico daqueles e daquelas que negam a Deus, portanto, são comunistas.
Os pobres de direita, de acordo com certas leituras e análises, ao se olharem no espelho, enxergam-se como simpáticos e felizes. Já os ricos, orgulham-se ao desfilar pelas avenidas, durante os domingos de sol, carregando a bandeira do país, vestindo verde, amarelo e pedindo o retorno da ditadura.
Os pobres de esquerda quase desaparecem, porque as igrejas, os pastores e as estruturas de poder e repressão, que os cercam, amedrontam todos os seus dias.
Uma boa parcela, daqueles e daquelas que estão distantes da pobreza e se consideram de esquerda, posicionam-se no lugar de observadores, identificando os personagens, suas ações, posturas e contradições. Por sua vez, significativa parcela dos políticos de esquerda, preferem manter certo distanciamento dos seus princípios e conceitos ideológicos, buscando a simpatia social.
Há erros nessa leitura. O primeiro acerca da politização. Não há, como alguns afirmam, tanta politização das pessoas, na direita ou na esquerda. Simplesmente porque elas não estão suficientemente esclarecidas acerca do que se discute na política. Portanto, o fato de uma pessoa identificar-se com alguém de direita ou extrema direita, não lhe confere um diploma de politizada. Ao contrário, têm-se o desejo, a rigor, de alcançar o que se necessita para viver – casa, comida, dinheiro, emprego, saúde e segurança. Há, todavia, aquelas/aqueles que se alimentam dessas narrativas e delas usufruem prestígios, privilégios, poder e riquezas.
Politização exige que as pessoas saibam e compreendam as discussões, as propostas e os projetos de poder em curso. Ou seja, devem – conscientemente – escolherem e serem capazes de entender a relevância dos pensamentos e das ações, exercendo a cidadania por completo, não apenas no ato de votar.
O segundo erro, nesse tipo de análise, vincula-se ao fato de subjetivamente sempre atribuir aos pobres a responsabilidade pelas escolhas que se fazem nas eleições. Imputa-se a eles, sofridos e descontentes, a eleição dos maus governantes.
Nega-se, nessas avaliações, as máquinas de mortes criadas e postas em movimento pelo sistema de dominação, que é brutal, duradouro, porque se prolonga pelos séculos e séculos. Até Jesus Cristo foi vítima, de acordo com a narrativa bíblica, dos pobres, preferindo Barrabás ao invés do Filho de Deus e, por isso, acabou crucificado.
Hitler, por exemplo, foi alçado e aclamado pelas massas. Em certa medida, dá-se aos alemães a pecha de terem sido defensores do holocausto.
O mesmo ocorre agora, diante das guerras, quando também se atribui ao povo judeu, em aliança com os norte-americanos, os massacres dos Palestinos e dos demais povos no Oriente Médio.
Os poderosos se articulam em blocos econômicos, através dos quais controlam as armas, a política, o mercado, os meios de comunicação, os poderes executivo, legislativo e o judiciário. Eles fixam as regras e as formas de gerir o destino das nações – inclusive as guerras. As pessoas, nesse ambiente, são vítimas, avalistas ou tão somente consumidores de um mercado imposto.
Portanto, teremos governantes tiranos, diplomatas, trabalhadores, ou mesmo intelectuais, mas, as máquinas de dominação, vão sendo reguladas, a depender do contexto, com maior ou menor agressividade.
Nos tempos de agora – dos avanços tecnológicos, da comunicação 5G, das mentiras como verdades – as utopias parecem esvaziadas.
Embora o caos aparenta ser irreversível, sempre haverá fluxos e refluxos, onde – com maior ou menor intensidade – serão estimulados os ideais de sociedades justas, fraternas e harmoniosas, contrapondo-se às brutalidades e extremismos.
As pessoas, em geral, são conduzidas, ou empurradas, às conjunturas que se lhes impõem, não sem dialética, não sem contradições, porque os humanos têm a capacidade de discernir e identificar o que é bom ou ruim, o que é melhor ou pior, o que é amargo ou doce.
E não se pode, de modo algum, culpabilizar os pobres pelos danos causados ao mundo, porque estes, quase sempre, são determinados por aqueles que, ao longo da história, o dominam.
Coordenação Colegiada do Cimi Sul - Conselho Indigenista Missionário.
Roberto Antônio Liebgott é missionário do CIMI - Conselho Indigenista Missionário, atuando na região Sul do Brasil.