Sônia Guajajara
As lutas indígenas a conduziram para longe, a moveram de seu lugar de viver – do meio de seu povo, de sua cultura – até as esplanadas das capitais e do mundo.
Os movimentos, as organizações, os povos em suas diferenças e protagonismos visibilizaram à causa indígena, tornando-a pauta política e jurídica.
E que passou a ser uma causa da humanidade, de todas e todos, despertando olhares, interesses, atenção, mas também perseguição, insatisfação e violência.
Você, mulher indígena, corajosa, assumiu, com vigor e determinação, a defesa da Mãe Terra, da Natureza e de todas e todos os seres que delas dependem e que clamam por cuidado.
Com sua voz, articulada a tantas outras vozes, proferidas e ecoadas através das inumeráveis organizações dos povos originários, denunciou a bruta violência e exigiu a demarcação dos territórios sagrados.
Agora, os passos dados a deixaram onde nunca antes uma mulher indígena esteve, chefiando um ministério de povos, uma missão nobre, necessária e urgente.
Agora Sônia, você não é somente a Sônia Guajajara da Apib – Articulação dos Povos Indignas do Brasil – uma candidata do Psol, uma deputada federal eleita, agora carrega consigo esperanças, anseios, desejos, sonhos, expectativas de muitos, de todos os povos indígenas.
Agora você, Sônia, será a indígena desterritorializada, acampada nas margens das rodovias sem água, sem casa, sem comida, sem assistência, afastada, expulsa de seu lugar de Ser e Viver.
Agora você é mulher indígena das retomadas, das centenas delas pelo Brasil, exigindo o direito de viver na própria terra, no lugar sagrado, dos antepassados, mas que os brancos com suas estruturas de justiça, poder e dinheiro não permitem.
Agora você é a Yanomami violentada, estuprada por garimpeiros invasores e criminosos, agora é a mãe com um filho doente sem assistência.
Agora você é Kaiowá, Kaingang, Pataxó, Truka, Xukuru, Wapixana, Maxacali e Mbya Guarani discriminados e perseguidos pelo latifundiário do agronegócio.
Agora você é mulher que integra um povo isolado nas matas antigas agredidas, ameaçadas, você é Awá-Guaja, Madijá, Canamari, Kaiapó e Galibi, você é Terena, Tucano, Macuxi, Maku, Kambeba, Mayoruna.
Agora você é Xokleng contra o marco temporal, contra as barragens, você é Xavante, Mynky, você é Karitiana, Surui, Enawene Nawe, Kokama, Krenak, Korubu, Marubo, Xerente, Krao Canela, Tapeba, Pankararu.
Você é mulher indígena, das centenas de povos, que precisam das terras demarcadas, protegidas e que possam nelas viverem na paz, cultivando seus saberes, suas culturas, crenças, memórias e tradições.
Agora você é mulher indígena dos contextos urbanos, desvalorizada, impedida de comercializar suas artes, de acessar as políticas públicas diferenciadas, impedidas de ter um lugar de viver.
Agora você não estará só, que suas companhias e parcerias tenham o mesmo olhar, os mesmos sentimentos e os mesmos objetivos que os seus, aqueles que lhe levaram até o Ministério dos Povos Originários, de um governo democrático que se comprometeu com a defesa dos direitos constitucionais dos excluídos e excluídas desse nosso país.
Que os Encantos de Luz, as ancestralidades e todas as demais forças espirituais estejam sempre a lhe guiar no caminho da justiça e do Bem Viver.
Porto Alegre, RS, 30 de dezembro de 2022.
Roberto Antônio Liebgott é missionário do CIMI - Conselho Indigenista Missionário, atuando na região Sul do Brasil.