Dois corpos arrebatados pela força dos sentidos
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Inaiê diante da descoberta que Ulisses era seu irmão ficou atordoada, uma enxurrada de sentimentos e lembranças invadiram seu pensamento, entre os sentimentos estava a felicidade de encontrar um irmão na sua jornada, algo impensado até então, pois havia apenas o sentimento de estar sozinha no meio da multidão, no mundo dos estranhos, partira para uma jornada solitariamente, encontrou um amigo e para sua surpresa seu irmão. Esses pensamentos invadiram a mente de Inaiê, juntamente com a lembrança e confirmação da morte dos seus pais biológicos, o que gerava em sua alma uma grande tristeza.
Diante do amálgama de sentimentos, os olhos de Inaiê umedeceram a tal ponto que as lágrimas jorravam sobre sua face, era a forma que seu corpo revelava ao mundo o que estava sentindo, mas não bastou, precisou de sussurros e um grito que ecoava a alegria do encontro e, ao mesmo tempo, a dor, por não ter a oportunidade de brincar, de passear com seus pais biológicos, de conhecer o seus outros irmãos, era um grito reclamando para o mundo o direito de ter as oportunidades que todas as famílias deveriam ter em viver e conviver juntos. Porém, seu corpo não conseguiu jogar para fora toda a extensão desses sentimentos, suas energias esvaíram-se, caído sobre os braços de Ulisses, que em um ato reflexo conseguiu evitar a queda da irmã.
Ulisses emocionado e assustado buscou trazer o ânimo para o corpo de sua irmã, mas, também, sentia a mistura do desespero com a felicidade, sua alma tinha a necessidade de reclamar para o mundo seu desejo e o direito de ter uma vida com dignidade para si e sua família, seu espírito foi sacudido com uma forte lembrança em que seus irmãos brincavam pela casa, enquanto seus pais, ao redor do fogão a lenha, seguravam um bebê, cuja lembrança ele havia esquecido, lembrou que seu pai a chamava carinhosamente de pequena princesa, era uma lembrança alegre, mas em seguida surgiu a tristeza do dia em que seu pai perdeu o seu trabalho, a vizinhança passou a não enxergá-los, passaram ser, por determinados momentos, invisíveis e, em outros, eram vistos com desconfiança. Essa lembrança trouxe um misto de dor, de ódio, de saudade, de ausência, pois a família ruiu diante da doença de seu pai e a falta de um trabalho digno. Todos esses sentimentos confundiam-se com a felicidade do encontro com a irmã, que era até então uma desconhecida. Todas essas lembranças e sentimentos levaram ao grito de desespero: Por quê?!
Em seguida as pernas de Ulisses amoleceram e diante de toda emoção caiu juntamente com sua irmã, no centro da cidade, dois corpos desfalecidos, mas com uma grande capacidade de sentir, emocionar-se, de querer algo mais do que fora dado durante a vida. Não havia ninguém capaz de responder ao grito de Ulisses que, também, se conjugava com a expressão do corpo e da alma de sua irmã e solicitava ao mundo a resposta sobre as injustiças, as indiferenças e a intolerância.
A racionalidade não dava conta em dar respostas ao grito dos dois estranhos, movidos pela força de sensações e sentimentos decorrentes das duras experiências de ser no mundo de dois órfãos, que naquele momento geravam desconforto para os transeuntes a tal ponto que a rua ficou vazia. Os gritos, o lamento, a súplica afastaram as pessoas daquele caminho. Desta vez, o despertar do pensamento não pode ajudar, restando ao silêncio revelar que a estranheza pode ter como efeito o medo seguido do afastar, pois para as pessoas que ali passavam havia dois estranhos, gritando desesperadamente, seriam dois loucos? Doentes? Quem teria coragem em se aproximar?
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Carlos Weinman possui graduação em Filosofia pela Universidade do Oeste de Santa Catarina (2000) com direito ao magistério em sociologia e mestrado em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria (2003), pós-graduado Lato Sensu em Gestão da Comunicação pela universidade do Oeste de Santa Catarina. Atualmente é professor da Rede Pública do estado de Santa Catarina. Tem experiência na área de Filosofia e Sociologia com ênfase em Ética, atuando principalmente nos seguintes temas: Estado, política, cidadania, ética, moralidade, religião e direito, moralidade e liberdade.