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Extremo-oeste está mais próximo de ter um Campus da UFFS

Extremo-oeste está mais próximo de ter um Campus da UFFS

Claudia Weinman
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No dia 20 de julho o Movimento Pró-Universidade, que se organiza há mais de 18 anos pela expansão da Universidade Federal da Fronteira Sul para o Extremo-oeste catarinense e é composto por diversas lideranças políticas, comunitárias, movimentos e pastorais sociais, estudantes e educadores/as, movimentos sindicais, organizações do comércio, esteve reunido com o Reitor e Vice-reitora eleitos, João Alfredo Braida e Sandra Pierozan, nas dependências da UFFS Campus de Chapecó, para mostrar a organização e articulação da região na luta por um campus. 

Reunião com o Reitor e Vice-reitora eleitos, João Alfredo Braida e Sandra Pierozan, em Chapecó, no dia 20 de julho. Foto: Movimento Pró-Universidade.

Uma pequena fala, segundo Pedro Henrique Binsfeld Pontes, de 12 anos, estudante do 7º ano na E.E.B. São Miguel, que certamente preencheu os corações de quem vem chegando e de quem já sonha com a UFFS na região há muito tempo, com esperança. O jovem contou que emocionado adentrou o espaço físico da UFFS campus Chapecó, idealizando o mesmo para sua região. “Como estudante, seria um sonho, não só para mim e para minha cidade, mas para milhares de jovens de toda a região do Extremo-oeste de SC”. 

Pedro atua como vereador mirim em São Miguel do Oeste, em suas palavras “é indescritível a emoção que eu sinto com a possibilidade de ter uma universidade pública, de qualidade, moderna, lá naquela região que por tantos anos foi esquecida dentro do nosso estado”. São de falas pequenas em tamanho mas gigantes em coragem que também são feitos momentos bonitos como esse. O estudante ainda agradeceu por quem já carrega há alguns anos as faixas escritas “É agora UFFS!” e garante que seguirá lado a lado por este sonho. “Eu cheguei agora nessa luta, mas quero agradecer a todos que estão desde 2005 trabalhando para que no futuro de jovens como eu, nós possamos ter uma universidade para nossa região, eu tô na luta pela UFFS e vou continuar até termos”. 

O Deputado Federal da Comissão de Educação, Pedro Uczai, avaliou o momento como importante e carregado de emoção, pelas falas feitas por jovens estudantes e lideranças que demonstraram, de acordo com ele, o desejo de uma Universidade Federal para o Extremo-oeste catarinense. 

“Depois de uma Audiência Pública que aconteceu em São Miguel do Oeste em junho do ano passado, reunindo todas as lideranças do Extremo-oeste e que reforçou a importância da mobilização, criando inclusive, um grupo de trabalho e comissão de articulação pelo Campus, tivemos esse momento  com o professor Braida e a professora Sandra, Reitor e Vice-reitora que tomarão posse no próximo mês, onde reafirmamos a necessidade do campus e, por parte deles, sentimos a emoção de perceberem como a região está organizada. Esperamos que eles possam colocar como prioridade o Campus em São Miguel do Oeste”, disse.

Segundo o prefeito de Anchieta e integrante do movimento Pró-Universidade, Ivan José Canci, a intenção é que se busque, por intermédio da Câmara Federal, a vinda do Ministro da Educação, Camilo Sobreira de Santana, para Chapecó, para o fortalecimento do movimento e a conquista de uma decisão favorável para a região.

“A reunião em Chapecó mostrou que os movimentos sociais, juventudes, Ameosc, entidades do comércio, IFSC, estudantes, sindicatos e outras lideranças estão em unidade para reivindicar o campus”. 

O objetivo a partir da audiência realizada no ano passado e da reunião em Chapecó é seguir articulando mais pessoas, organizações e entidades para fortalecer a luta pela UFFS, como detalha Lais Cristina Telöken que representa o Colegiado de Educação da Associação dos Municípios do Extremo-oeste de Santa Catarina e do grupo de trabalho de comunicação do movimento Pró-Universidade. 

“É preciso seguir mostrando a nossa organização. Ouvimos do reitor e vice-reitora eleitos que o nosso movimento é forte, está estruturado e é exemplo em termos de organização e, por isso, merecemos ter uma Universidade Federal aqui. A reunião com eles foi emocionante, especialmente por ouvir o depoimento de jovens que não podem pagar pelo ensino superior, o quanto isso impacta na vida da juventude”, destacou.

“Se a educação não pode tudo, alguma coisa fundamental a educação pode” 

Diálogos nas escolas sobre o sonho de uma universidade pública e de qualidade. Foto: Coletivo da Pastoral da Juventude do Meio Popular e Rural.

O que faz do Brasil o país com a 3ª maior população encarcerada do mundo? Quando nos deparamos com uma realidade de quase 712 mil presos em solo brasileiro, nos perguntamos do que seria capaz a educação pública, gratuita e de qualidade, se garantida para todos os brasileiros e brasileiras. Era provavelmente um sábado, dia habitual das idas até as comunidades das periferias e da roça para conversar com a juventude. Em círculo, na comunidade da Pedreira, em São Miguel do Oeste, cada um e cada uma, olhando olho no olho, encontrava neste espaço a escuta das angústias e dos sonhos das juventudes. 

Foi em um destes finais de semana, há cerca de 18 anos, este específico tinha como tema a educação, que um jovem questionou por que no município em que ele morava não tinha uma universidade federal. Foi a primeira vez que este questionamento surgiu nos grupos de base, deixando a assessora do encontro sem resposta imediata. Jociani Pinheiro, que faz parte da assessoria da Pastoral da Juventude Rural (PJR), conta que foi este mesmo menino que carregou, nas ruas de São Miguel do Oeste, a primeira faixa pela universidade pública. Há cerca de 9 anos este menino está preso. A universidade pública ainda não chegou em sua região. 

São 18 anos de reuniões, seminários, encontros nas comunidades, visitas em escolas, falas na igreja, atos de rua. Reuniões difíceis e extensas, horas de viagem e ausência nos encontros familiares.

Ali é o horizonte, nós estamos chegando, estamos chegando”… Motivada pela utopia que nos faz caminhar, Jô, como é conhecida pelos companheiros/as de luta, nunca esqueceu do questionamento daquele menino. Foi na mesma época deste questionamento que a luta pela UFFS, que já acontecia em outras localidades, iniciou na região do Extremo-oeste. “Nesse meio tempo já havia organização do movimento, ela já existia, já acontecia, já havia essa intenção. Mas para nós enquanto Movimento Pró-universidade da região Extremo-oeste ela começou nesse período, para nós, PJR e PJMP, começou com a fala do Leonardo* da Pedreira”.

Foto de 2005: Coletivo da Pastoral da Juventude Rural e do Meio Popular.
Entrega do pré-projeto para o então vice-reitor Antonio Andrioli. Foto: Movimento Pró-Universidade.

De acordo com dados do Infopen, publicados pelo portal Politize, o grau de escolaridade da população carcerária brasileira é extremamente baixo. “Enquanto a média nacional de pessoas que não concluíram o ensino fundamental é de 50%, no sistema prisional 8 em cada 10 pessoas estudaram no máximo até o ensino fundamental”. 

São inúmeras as falhas estruturais da sociedade capitalista que cria desigualdades e provoca um crescimento acelerado da população prisional no Brasil. “Para quem está há tanto tempo e viu jovens esperançarem por essa universidade, viu jovens se perderem por falha nossa e por falta de outras coisas, falha social, do capital, um jovem da favela é empurrado para a criminalidade. A sociedade em volta pensa que quem mora na favela é criminoso, o capital empurra para isso, então quando você vê um jovem saindo da favela para fazer faculdade é vitorioso para nós, mas quantos conseguem?”. Para a assessora da PJR, ver a juventude da favela se organizando em uma luta tão grandiosa quanto a luta pela UFFS, demonstra que a mística da luta unifica. “As pessoas que estão vindo e entrando precisam saber que estão sendo envolvidas em uma mística, que é a mística da luta, do sonho coletivo, da conquista”. 

“Antes do nome, um sonho” 

Foto: Coletivo da Pastoral da Juventude Rural e do Meio Popular.

Assim inicia o histórico de luta pela UFFS na região do Extremo-oeste, produzido em formato audiovisual, que foi apresentado em audiência pública com a presença do interventor e atual reitor da UFFS, Marcelo Recktenvald. A frase tem, para Jô, um grande significado já que antes que a UFFS tivesse um nome, já era sonho de muitos/as jovens da roça e das favelas. “E talvez não era [ainda] nem um sonho, mas um questionamento: “Por que não existe, por que não tem?”.

De 2005 para cá, muitas pessoas estiveram engajadas na luta pela UFFS, muitos/as dos/as jovens que estiveram na coordenação do movimento e participaram de inúmeras reuniões, hoje estão se formando em outras universidades, outros/as não conseguiram sair para estudar em uma universidade pública. Jô acredita que estes/as jovens continuam sonhando pois deixaram sua marca nesta história.

“Muita gente que não está mais aqui orgânico mas passou pelo movimento, ainda carrega o sonho, porque quem é da grande região do Extremo-oeste sonha coisas importantes. E eles sonham porque a luta é apaixonante, porque quando você luta você vai somando, vai somando nos sonhos, no jeito de lutar, na mística, e isso tu não perde, pode perder o vínculo, mas não perde a mística”. 

A luta pela UFFS foi atravessada por um dos momentos mais sombrios da história recente do Brasil. A eleição de Jair Bolsonaro regrediu em muito a caminhada já realizada durante todos esses anos. “A esperança, o horizonte, ficaram muito mais longe com o desmonte da educação e de tudo que tínhamos direito (…) Foi a desesperança da vida, não era só ‘não vamos ter a UFFS’, nós não vamos ter comida, dignidade, o povo tá perdendo tudo”, comenta Jô Pinheiro. Passada grande parte da tempestade, era hora de recomeçar, e para isso é preciso coragem. Para Jô, a coragem para recomeçar chegou quando as organizações perceberam que a esperança era possível. “Eu acredito que sim, que tem que ser agora! (…) Porque a gente não sabe até aonde vamos conseguir manter a luta, a organização, quem é o inimigo que vai se organizar para vir contra nós, que força tem esse inimigo. A gente sabia a força do golpe de 2016 e que ali estavam os inimigos, mas a gente não sabia a dimensão que era, porque para eleger Bolsonaro isso quer dizer que a força inimiga era muito grande”.

“Só a luta faz valer”

Vivemos mais um momento em que a história precisa se fazer presente para que não ousemos vestir uma velha roupa colorida que não nos serve mais, como já bem dizia Belchior em 1976, em um contexto de repressão e censura imposto pela Ditadura Militar. Para Jô, dizer que “só a luta faz valer” significa que não existe conformismo com a atual conjuntura com Lula à frente da presidência. “Não dá para parar aqui, a luta precisa prosseguir agora, mais do que nunca, porque agora a gente tem possibilidade de força, agora, pelo menos, a gente consegue organizar as bases sem tanto temor. Então é importante que seja logo porque a gente não sabe como as forças ‘de lá’ estão se articulando”. 

A continuidade da luta é a força que dá coragem de seguir, convocar que já esteve na luta para que volte e se reencontre, somar as vidinhas novas que vão chegando, os filhos e filhas da luta que vão se forjando no processo histórico.

“Eles fazem parte do sonho antes mesmo de imaginarmos que eles viriam, eles já fazem desse sonho porque o sonho tem a ver com a caminhada, com a marcha, e eles vieram durante a marcha, e agora seguem marchando, nessa caminhada”, menciona Jô, que tem o desejo de que o povo se levante pela UFFS e que a universidade se pinte de povo, não só como estudantes mas, também, como educadores. 

Inspirada pelos ensinamentos de Paulo Freire, “se a educação não pode tudo, alguma coisa fundamental a educação pode”, a sempre jovem lutadora finaliza:

“Não só pela UFFS, mas por dignidade e vida para todo o povo, justiça, igualdade, fraternidade. Sempre que eu ouvia essa frase, eu pensava: ‘essa alguma que o Paulo Freire fala deve ser o horizonte que eu acredito’. Porque essa é a ‘alguma coisa’ que eu quero. Pelos jovens que se perderam, pelos jovens que se reencontraram, pelas jovens e pelos jovens que nós perdemos, ‘É agora UFFS no extremo-oeste”! 

*O nome do jovem foi substituído por pseudônimo para preservar a sua identidade.

Dados do sistema carcerário no Brasil: https://www.cnj.jus.br/sistema-carcerario/cidadania-nos-presidios/#:~:text=Os%20dados%20apresentados%20revelam%20que,mil%20vagas%20no%20sistema%20carcer%C3%A1rio

Escolaridade nas prisões: https://www.politize.com.br/educacao-nas-prisoes/#:~:text=Segundo%20dados%20do%20Infopen%2C%20o,m%C3%A1ximo%20at%C3%A9%20o%20ensino%20fundamental

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