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Por que precisamos falar sobre política na educação?

Por que precisamos falar sobre política na educação?

Paula Andrea Grawieski Civiero
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É muito comum ouvir algumas pessoas dizerem que não gostam de política e/ou que evitam falar sobre esse assunto.

Muito provavelmente, as pessoas com esse pensamento estão acometidas pelo que vamos denominar de “síndrome do aborrecimento com a política”, que é gerada pelo uso equivocado ou com fins escusos e pessoais, que determinados grupos, sobretudo vinculados a partidos, fazem da política partidária, gerando preconceitos.

Isso, associado a avalanche de fatos e fakes a que somos submetidos todos os dias pelas redes sociais e mídia, sem dúvida, incitam o imaginário coletivo a criar mecanismos de defesa, pois a política passa a ser tratada em nosso inconsciente, como algo que corrompe a dignidade ou que é destinada para poucos (“aqueles que têm estômago” ou os “pré destinados” ou ainda para aqueles que têm “sangue político nas veias”).

No entanto, toda essa concepção não passa de um grande engano, de uma estratégia para nos manter longe desse cenário e sem disposição para compreendê-lo.

A notícia boa é que, segundo Hanna Arendt, importante filósofa política do séc. XX, esses preconceitos não são juízos definitivos. Na verdade, eles indicam que chegamos em uma situação na qual não sabemos nos mover politicamente, por isso criamos esses estigmas.

Afinal, não há como fugir da política! Ela faz parte da nossa vida e fazemos política a todo momento, mesmo sem perceber. Olhe os conceitos.

Segundo Hanna Arendt, a política trata da convivência entre diferentes. Ou seja, os homens se organizam politicamente para conseguir viver em sociedade, para evitar um caos absoluto, gerado a partir das diferenças. Schmitter diz que a política é a resolução pacífica para os conflitos.  E, Maria das Graças Rua, complementa, afirmando que a política consiste no conjunto de procedimentos formais e informais que expressam relações de poder e que se destinam à resolução pacífica dos conflitos quanto a bens públicos.

Em linhas gerais, todos esses conceitos nos permitem compreender que a política está presente no nosso dia a dia. Seja por meio de procedimentos informais, como quando mediamos uma discussão entre nossos filhos, ou ainda, quando brigamos com o namorado e resolvemos voltar. Ou formais, como quando explicamos aos alunos os critérios que serão utilizados para a avaliação no semestre ou colocamos em pauta um assunto difícil em uma reunião de trabalho.

O tempo todo participamos da mediação entre diferentes e o fim é (quase sempre), a resolução pacífica do conflito.

Quando este conceito não é suficientemente discutido, estudado e entendido ou é motivado por fake news, pode ter resultados devastadores. Um exemplo claro disso foram os ataques ocorridos no dia 8 de janeiro de 2023 por grupos extremistas, que invadiram e depredaram os prédios do Congresso, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Palácio do Planalto.

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A destruição provocada em Brasília, inclui patrimônios históricos que dificilmente poderão ser recuperados e alcançou também os espaços privativos que as autoridades usam para trabalhar diariamente. Mas, muito mais do que danos materiais, os extremistas macularam a democracia tão arduamente conquistada, aviltando a dignidade dos brasileiros e deturpando o conceito e o sentido legítimo de política.

Por isso, é equivocado alguém pensar ou dizer que não gosta de política ou não quer falar ou estudar sobre o assunto, pois ele permeia a nossa vida. Ao contrário disso, o que se deve fazer é, ampliar o olhar sobre as ações políticas que exercemos cotidianamente e, gradativamente, quebrar o preconceito sobre a “política partidária”; que tem os mesmos objetivos da política (a que é inerente ao ser humano), porém entremeada por definições ideológicas sobre como resolver os conflitos. Afinal, não se pode esquecer que, quem opera na política (partidária), não atua por outra razão central senão, conquistar, ampliar ou, manter o poder (BOURDIEU, 2004; MAQUIAVEL, 1996).

Sendo assim, a discussão sobre política precisa ser um dos objetos da educação, pois oportuniza e amplia as condições de se avaliar a ação, os produtos e os impactos dos atos e decisões políticas e, especialmente, de se reconhecer que isto tudo tem uma intimidade destacável com a luta pelo poder. Tratar desse assunto em sala de aula, é oportunizar aos estudantes uma melhor compreensão do que e como se constitui a agenda política e a política propriamente dita; o que reverbera no entendimento dos movimentos da ação do Estado ante as demandas, e no conhecimento de causa sobre o assunto, subsidiando o exercício da pressão e do controle social.

Abster-se de estudar e falar de política, sobretudo a partidária, é abrir mão de refletir e decidir sobre como a nossa vida pode ficar melhor, como nossos conflitos – direito a educação, ao emprego, a saúde, a cultura, a mobilidade, a habitação, etc. – podem ser resolvidos. É abrir mão de algo que está na nossa essência e que precisa de nossa atenção e reflexão. E mais do que isso, é permitir que o processo democrático esteja permanentemente ameaçado, assim como a dignidade humana.