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Você pensa? ou pensa que pensa?

Você pensa? ou pensa que pensa?

Paula Andrea Grawieski Civiero
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Créditos da imagem: revistapegn.globo.com

Parece ridículo à primeira vista, perguntar a uma pessoa se ela pensa. Afinal, histórica e biologicamente, somos considerados seres racionais e, portanto, dotados de capacidade de pensar e fazer uso da razão. Mas, em que medida na atual conjuntura isso é realmente verdade?

Segundo afirma o jornalista Frankin Foer, fazemos parte de uma sociedade que está terceirizando suas capacidades intelectuais para empresas como Apple, Google e Facebook. Segundo ele, nós, homo sapiens, chegamos a um momento da evolução em que estamos deixando para trás as características que mais nos diferenciaram até aqui das outras espécies: o fato de sermos capazes de pensar, imaginar, refletir e conhecer. O que, por consequência, está dando ascendência a uma vida cada vez mais automatizada, fria, padronizada e sem valores reais.

E sabe o que é mais contraditório disso tudo? Nunca se “leu”, viu e nem se produziu tanta informação, como hoje! Com alguns toques no smartphone, temos na palma da mão um universo de textos, vídeos, áudios, sobre qualquer assunto.

Mas será que estamos lendo, vendo e ouvindo de verdade? Estamos apreendendo e analisando criticamente tudo que buscamos ou que nos é oferecido? Estamos ampliando nossos conhecimentos, transformando-os em sabedoria e os utilizando para a edificação de um mundo melhor? Infelizmente, as pesquisas mostram que não!

Na verdade, estamos obcecados com nossos e-mails e redes sociais e, não estamos muito preocupados com os efeitos que a tecnologia está exercendo sobre a maneira como lemos, vemos, ouvimos e processamos a informação; e, consequentemente, sobre os impactos à nossa cognição e ao futuro da humanidade.

Apesar dessas tecnologias milagrosas encurtarem as distâncias que nos separam, seu formidável e incomparável magnetismo, não é mero acaso. Estamos sendo submetidos diariamente a mecanismos de vício comportamental, que interferem diretamente na maneira como nos comunicamos e relacionamos uns com os outros, como formamos nossas opiniões, como lidamos com nosso dinheiro e com os limites entre trabalho e lazer (geralmente sem perceber que não estipulamos mais esses limites). A mão invisível do capital atua também nessa esfera, nos tornando meros usuários de tais tecnologias, pois na maioria das vezes, não questionamos os interesses de quem as está desenvolvendo.

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Talvez por isso, nunca tenha havido na história um declínio tão acentuado nas habilidades cognitivas, afinal apenas trinta minutos por dia na frente de uma tela são suficientes para que o desenvolvimento intelectual de uma criança comece a ser afetado; e, indiscutivelmente, o uso da tecnologia digital pelas novas gerações tem sido astronômico. Crianças de 2 a 8 anos de idade, tem usado em média cerca de três horas por dia. Entre 8 e 12 anos, a média diária gira em torno de cinco horas. Na adolescência, esse número sobe para quase sete horas, o que significa mais de 2.400 horas por ano, em plena fase de desenvolvimento intelectual.

Portanto, ao contrário do que a imprensa e a indústria da tecnologia costumam difundir, o uso das telas, acarreta sérios problemas à saúde do corpo (obesidade, problemas cardiovasculares, expectativa de vida reduzida), do estado emocional (agressividade, depressão, comportamentos de risco) e do desenvolvimento intelectual (empobrecimento da linguagem, dificuldade de concentração e memória). Ou seja, existem perigos reais nas telas (pela frente e por trás delas) e serão graves as consequências se continuarmos a promover, sem senso crítico, o uso dessas tecnologias.

Por isso, é importante voltar a pergunta inicial: você pensa? Ou pensa que pensa? Independente da resposta, é melhor dar atenção a essa reflexão.