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Marco Temporal: povos indígenas se reúnem no Oeste Catarinense e dialogam sobre os próximos passos da luta

Marco Temporal: povos indígenas se reúnem no Oeste Catarinense e dialogam sobre os próximos passos da luta

Claudia Weinman
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Indígenas Kaingang, Xokleng e Guarani estiveram reunidos hoje, sexta-feira, 3 de junho, na comunidade Toldo Chimbangue, em Chapecó, no Oeste Catarinense, para conversar sobre a retirada de pauta do julgamento, agendado para o dia 23 de junho, do Recurso Extraordinário 1.017.365 relativo a reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra a demarcação da TI Ibirama-Laklanõ. O julgamento em questão irá definir sobre o presente e o futuro das demarcações das terras indígenas no Brasil. Em 2019, o STF deu status de “repercussão geral” ao Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365, o que significa que a decisão servirá de diretriz para a gestão federal e todas as instâncias da Justiça no que diz respeito aos procedimentos demarcatórios.

Nesta sexta-feira, os povos indígenas seguem organizados em Santa Catarina para pensar os próximos passos na luta pela retomada do julgamento, pelo STF. O momento é simbólico e acontece no Toldo Chimbangue, território que inaugurou um novo processo de demarcação de Terra Indígena (TI). Foi o primeiro caso no Brasil em que um povo indígena recuperou uma terra que em sua totalidade estava ocupada por não indígenas, com registro cartorial dos imóveis, inspirando o movimento indígena brasileiro.

Importância do julgamento

No mês de abril deste ano, Brasílio Priprá, liderança do povo Xokleng, concedeu entrevista para A Fronte – Jornalismo das Gentes, sobre a tese do Marco Temporal e as discussões envolvendo esse tema durante a realização do Acampamento Terra Livre, que reuniu mais de sete mil indígenas de mais de 200 povos no Complexo Cultural Funarte, no Eixo Monumental em Brasília, seguindo o tema: “Retomando o Brasil: Demarcar Territórios e Aldear a Política”.

Na ocasião, Brasílio destacou que os povos buscam apoio para que o direito originário seja respeitado na votação que deveria acontecer em junho, quando o julgamento do século, assim entendido pelas lideranças e apoiadores/as retornaria à pauta do STF. “Esperamos que os ministros votem a repercussão geral que beneficiará as comunidades indígenas no Brasil. Nessa batalha a gente sempre diz: defender o meio ambiente não é só defender os povos indígenas, mas a sociedade brasileira, o mundo. Algumas lideranças têm conversado com os ministros para não reconhecer o Marco Temporal. Também estive ontem nesta tarefa. Estamos buscando apoio do judiciário, pois o legislativo está muito difícil, quase todos são contrários aos povos indígenas”, contextualizou na ocasião.

Rafael Modesto, advogado da assessoria jurídica do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), falou que até agora votaram os ministros Edson Fachin e Kassio Nunes Marques. O ministro Alexandre de Moraes realizou o pedido de vistas. “Os votos indiciais são antagônicos, onde Fachin defende a tese do indigenato, da garantia das demarcações das terras indígenas e Nunes Marques adota a tese ruralista do marco temporal. Com o julgamento empatado em um a um, certo de que o voto do ministro Alexandre de Moraes vai ser extremamente importante, já que pode trazer uma terceira posição e influenciar o plenário”, explicou, reforçando ainda que se somam no total, 11 votos.

O julgamento que estava previsto para o dia 23 de junho de 2022 é extremamente importante para a conjuntura brasileira. A aprovação de um marco temporal vai ampliar o genocídio dos povos indígenas. Essa tese ruralista poderá ser utilizada para dizer que os povos indígenas só podem reivindicar terras onde já estavam na data de promulgação da Constituição Federal – 5 de outubro de 1988, ao contrário da “teoria do indigenato”, que reconhece o direito dos povos indígenas sobre suas terras como um direito originário.

Para Roberto Liebgott, que integra a coordenação do Cimi Sul, o ideal, para a causa indígena, seria a retomada neste momento do julgamento com a apresentação do voto do Ministro Alexandre de Moraes. “Ele deve apresentar uma espécie de solução média, ou intermediária, entre a posição do relator Ministro Fachin e do Nunes Marques. O Alexandre de Moraes certamente vai acolher boa parte do voto relator, mas pode também aderir a algumas teses restritivas. Com o voto dele teríamos desenhos dos cenários possíveis e isso ajudaria na luta e na mobilização dos povos e seus aliados. Mas agora, esse julgamento deve ser retomado depois da posse do novo Congresso, uma outra legislatura, e de uma nova gestão no Executivo e também com a substituição na presidência no STF, não mais a do Ministro Fux, ao que consta será a Ministra Rosa Weber”, alertou.

O Cimi nacional divulgou uma nota sobre a retirada de pauta do julgamento, destacando a reflexão sobre a  insegurança jurídica e política que tal decisão instaura.

Nota do Cimi: retirada de pauta do julgamento sobre demarcação de terras indígenas gera insegurança jurídica e política

 

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O Conselho Indigenista Missionário também acompanhou a reunião desta sexta-feira, junto aos indígenas e apoiadores da causa no Oeste Catarinense. Confira algumas imagens feitas por Cláudia Battestin, professora da Unochapecó, Ivan Cesar Cima e Jacson Santana, da coordenação do Cimi Sul.